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        A moça corre pelos campos verdejantes, parando de vez em quando para colher flores.   Despreocupada, ri e brinca, sem desconfiar de que bem perto dali alguém a vigia, de pé numa carruagem, oculto no arvoredo.  É Hades, o deus dos mortos e dos mundos subterrâneos.  Esse sinistro personagem, sombrio e inquietante, nunca conseguiu encontrar uma deusa que aceitasse casar-se com ele.  Resolveu então lançar seus olhos cobiçosos sobre a alegre moça, Cora, única filha de Deméter, deusa dos trigais e das colheitas.Hades

        Ele a espia.  Enquanto isso, Cora se aproxima.  De repente, com um brutal rugido das rodas, Hades faz a carruagem correr a toda a velocidade e agarra Cora pela cintura, levando-a para longe.

        Um pastor de ovelhas e um guardador de porcos, que tomavam conta de seus rebanhos na vizinhança, olham assustados quando passa aquele bólido puxado por cavalos negros.

        Então, em meio de um barulho terrível, o chão abre-se e engole a carruagem.

        Sem ligar aos gritos de pavor da inocente Cora, Hades carrega-a para baixo do solo, para o triste reino dos infernos.

        Ao cair da noite, Deméter vê que a filha não volta.  A deusa vai ficando cada vez mais preocupada.  Sai pelo campo à procura da jovem.  O acaso faz que encontre os dois homens que testemunharam tudo.

        Eles, aterrorizados, contam-lhe o que aconteceu.  Infelizmente, esse relato não deixa dúvidas.  Deméter reconhece logo o raptor de sua filha e desespera-se, pois não pode imaginar como vencer o implacável Hades, irmão de Zeus.

        No auge da aflição, Deméter sai vagando pela Terra.  Louca de dor, proíbe que o capim, as árvores, os frutos e os cereais cresçam.  Dalia a poucas semanas, a espécie humana está ameaçada de morrer de fome.

        Tanto das cabanas mais pobres quanto dos palácios mais ricos, erguem-se lamentos que dilaceram o coração.  Os homens levantam seus punhos em direção ao céu, as mulheres gemem, as crianças choram.

        Ao ouvir esses gritos de dor, Zeus inquieta-se e alarma-se.  Envia vários deuses para acalmar a dor e a raiva de Deméter e pedir-lhe que faça renascer a vegetação.  Mas Deméter está irredutível:  nenhuma planta nascerá enquanto Cora não for devolvida.  Preocupado, Zeus resolve então mandar seu mensageiro Hermes, rápido e habilidoso, tentar dar um jeito nessa situação difícil.

        Hermes ordena a Hades que leve Cora de voltaà mãe.  Mas, ao mesmo tempo, anuncia a Deméter que sua filha só regressará se, durante a temporada no inferno, não tiver tocado em nenhum alimento dos mortos.  Felizmente, desde seu rapto a moça não comeu mesmo nada.  Passou o tempo todo chorando e gemendo, assustada pelo lugar apavorante para onde foi levada contra a sua vontade.  Por mais que fique furioso, Hades tem de ceder diante do mensageiro de Zeus.  Manda buscar Cora e, mal disfarçando a decepção, anuncia-lhe:

        ---   Você é infeliz em meu reino, e sua mãe está com saudades.  Vou devolvê-la.

        Essas palavras acalmam tanto o desespero de Cora que suas lágrimas secam.  Ela quase dá um beijo no sombrio Hades.  Este manda preparar a carruagem de Hermes e ordena que a moça suba.  Os cavalos já estão quase partindo quando um jardineiro de Hades aproxima-se e, com um sorriso malvado diz:

        ---   Ainda há pouco, Cora colheu uma romã no pomar e comeu sete sementes.  Eu contei!

        Então, a coitada provou mesmo a comida dos mortos, embora muito pouco.

        Cabisbaixa, ela reconhece que o jardineiro diz a verdade.  Hades sorri, satisfeito.  Sem esperar mais nada, ele também pula na carruagem, indo com o jardineiro, Hermes e Cola a Elêusis, no leste da Grécia, onde mora Deméter.  Esta, radiante de felicidade, pode enfim abraçar a filha que julgava perdida para sempre.

        Mas a sua alegria dura pouco.  Hades logo lhe conta o incidente da romã, confirmado pelo testemunho do jardineiro e pela confissão da própria Cora.  A notícia desconsola Deméter, que, em sua dor violenta, grita:

        ---   Já que é assim e que eu não vou mais ver minha filha, então vou manter minha maldiçãoPersefone. sobre a Terra!  O solo ficará estéril para sempre!

        Em sua sabedoria, Zeus propõe uma solução: durante três meses do ano Cora viveria debaixo da terra com o marido, Hades, e então se chamaria Perséfone, "aquela que causa destruição".  Nos outros nove meses, porém, ficaria com a mãe.

        A proposta não satisfaz ninguém, mas é aceita por todos.

        E é por isso que, na primavera e no verão, quando Cora está com Deméter, esta cobre a terra de uma vegetação luxuriante e verde.  No outono, quando se aproxima a hora da partida, Deméter fica triste, as plantas deixam de crescer, as folhas secam.  Mas, quando a filha se transforma na inquietante Perséfone, a deusa, desesperada, amaldiçoa o solo.

        E nada cresce durante os três meses que os  homens chamam de inverno.

 

 

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